Padre Júlio Lancellotti dá lições sobre valores cristãos no Programa Mais Vida da Rede Piedade de Educação

Em uma noite especial, a Rede Piedade de Educação trouxe, para mais uma edição de seu Programa Mais Vida, Padre Júlio Lancellotti, coordenador da Pastoral do Povo de Rua da Arquidiocese de São Paulo e uma personalidade muito presente no atual contexto pandêmico por meio de suas inúmeras práticas solidárias nas ruas. Junto com o Padre, estiveram a Madre Superiora da Congregação, Teresa Cristina Leite e a diretora educacional da Rede Piedade, Irmã Márcia Santiago, que conduziram o programa apresentado pelo relações-públicas, José Alessandro.

Padre Julio Lancellotti foi recentemente laureado com o Prêmio Zilda Arns de Direitos Humanos. O prêmio consiste em um diploma de menção honrosa concedido anualmente a cinco homenageados que se destacam ativamente na defesa dos direitos das pessoas idosas.

Madre Teresa Cristina Leite abriu a live com a pergunta: “Houve algo que lhe inspirou, lhe moveu neste sentido de despertar vocacional? ”.
“A vocação é uma construção, nunca é uma resposta pronta, vamos completando com a vida, ainda estou respondendo. Na vida religiosa, assim como no casamento, na educação, ninguém pode dizer que já é suficiente. Ela é uma das respostas ao amor de Deus. Assim como, especificamente na pandemia, os profissionais de saúde estão respondendo com suas pesquisas atenção e dedicação diária.
Desde a infância a vida da paróquia me encanta. Meus pais eram religiosos, mas nunca me influenciaram. Entrei para o seminário na adolescência, saí, voltei, fui convidado a sair de novo. O exemplo de figuras como Dom Luciano Mendes e Dom Paulo Evaristo Arns foram influências inspiradoras. Não posso dizer que estou acabado, construo muitas respostas todos os dias sobre ser uma igreja compassiva e religiosa inspirada no testemunho do Papa Francisco, de Dom Helder Câmara, de Santa Dulce, Nhá Chica, Padre Vitor e tantos outros atentos a ter um comportamento ao amor de Deus que sempre nos leva a servir”, respondeu o Padre Júlio.

Após, a Irmã Márcia Santiago questionou: “O senhor imagina como será o seu legado daqui alguns anos? O que o senhor espera, anseia? O senhor vislumbra que as ações que protagoniza junto aos mais necessitados possam repercutir e gerar novos frutos, novas ações? ”

“Um grande sinal da evangelização é o testemunho do Papa Bento XVI, que disse na abertura da Conferência Latino Americana em Aparecida que a evangelização se dá por atração, e não para o proselitismo. É importante a explicitação da fé, mas é mais importante o testemunho da bondade. A compaixão, a solidariedade e a misericórdia não são da dimensão religiosa, mas da humana. Temos que vivenciar a humanização da vida. Dalai Lama, quando questionado sobre qual seria a melhor religião, surpreendeu respondendo que é aquela que te faz mais humano. O grande legado é o segmento de Jesus, que se dá de muitas maneiras em diferentes momentos históricos e conjunturas sociais e políticas. Jesus não pode ser seguido no fundamentalismo, na alienação, no individualismo e subjetivismo exacerbado, por isso, não tenhamos medo de ir contra a corrente. Assim como Dom Pedro Casaldáliga e Dom Hélder Câmara mostraram, o grande caminho para o cristão é seguir Jesus, não é uma questão pessoal, é humanitária”, enfatizou o Padre.

A Dona Iara Braga, voluntária do Espaço Irmã Benigna de Voluntariado, foi uma das convidadas para participar do encontro. Inspirada pela passagem bíblica, no capítulo 10 do livro de Marcos, versículos 17 e 18, ela indagou: “Deus é nossa referência maior de bondade suprema. O senhor poderia deixar algumas palavras que nos inspirem nesta busca constante em ser bom, em ser do bem? ”
“O livro Deus é Bom, de Bill Jhonson, fala bem sobre isso. Não somos nós que vamos a Deus, Deus é que até nós. No Evangelho de João, sempre que o Jesus ressuscitado se manifesta ele está no meio. A Geometria nos ensina que o ponto do meio é equidistante de todos os outros pontos. Nenhum de nós está perto de Deus, Ele é que está perto de nós. Deus não está acima de todos, está no meio de nós, este é Seu lugar. Estando no nosso meio, nos contagia com sua bondade. E como Deus nos ama? João nos diz que tendo Ele amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim, isto é, até às últimas consequências. É na bondade de Jesus que vemos Deus. Jesus não julgou, não rejeitou, não afastou, não moralizou. Impediu que uma mulher fosse apedrejada sem uso de força ou armas, mas chamando à consciência e à responsabilidade. Multiplicou o pão para os famintos ensinando a solidariedade e a partilha. Nesse momento histórico de tantos desafios, aumento de fome, desemprego, cada vez mais pessoas vivendo nas ruas, crianças abandonadas, quilombolas e indígenas sofrendo ataques, temos que lutar contra o preconceito, o racismo, a homofobia. A bondade não pode ser uma ideia, ela tem quer ser uma experiência. Momentos de tantas incertezas e dificuldades instalam a desordem que vemos com pessoas humanizando animais e animalizando humanos. Gosto muito de bichos e plantas. Me passa horror ver uma planta morrer de sede. Mas o vaso não pode ser a gaiola da planta, todos os seres vivos merecem viver em liberdade. Em tudo, é preciso equilíbrio”, disse o Padre Júlio.

Também voluntária do Espaço Irmã Benigna, Ana Montebelo perguntou: “O senhor percebe esta rede do bem crescendo dia a dia? ”

“O egoísmo e a bondade vão sempre viver em nós. Celebrando uma missa em uma favela, eu pregava sobre partilha e solidariedade. Um menino vestindo roupas rasgadas e seu cão puseram-se ao meu lado. Num momento ele saiu, e depois reapareceu, sempre seguido pelo cachorro. Quando voltou, me apresentou um pequeno saco contendo um pouquinho de arroz. Falei para as irmãs procurarem pelo barraco em que ele vivia, porque sua situação me fez crer que a família passava por dificuldades. Quando procurada, sua mãe pediu desculpas e disse que ela só tinha uma xícara de arroz e que, ainda assim, ele insistiu em levar a metade porque o padre ensinou que temos que partilhar. Isso tem mais de 30 anos e eu nunca esqueci. A bondade é maior do que a maldade, a questão é que a maldade muitas vezes é exercida a partir do poder. Os bons nem sempre tem o poder, mas tem a coragem de partilhar. Quando recebo críticas ao meu trabalho na cracolândia digo que até os prisioneiros de guerra têm direito de comer e beber. Jesus ensinou a partilha pelo grande milagre da multiplicação. Doar não é passar para frente o que é velho ou não te serve mais, mas dar doar o que você também precisa. Um garotinho perguntou à sua mãe se era para dar tudo o que era velho e, diante da resposta positiva, questionou: e o que faremos com a vovó? ”, contou o Padre.

A Irmã Rosemeire, do Lar Augusto Silva, mostrou um vídeo apresentando o trabalho do espaço, que atende idosos, e perguntou: “Como o senhor percebe a importância de alimentarmos também a mente, o coração, a alma de nossos irmãos? ”
“Esta pergunta já traz a resposta. A partilha não é só dar o alimento. É importante olhar nos olhos, perguntar o nome. Os idosos foram muito afetados pela pandemia. Muitos ficaram com sofrimento mental sem poder ver filhos, netos e bisnetos, muitos tiveram membros novos na família que não puderam conhecer até hoje. A história dos idosos tem que ser respeitada. Os jovens devem visitar, acolher com palavras de afeto e atenção, ter carinho. Muitos idosos estão esquecidos e até mesmo doentes. Merecem um cartão, uma flor, um carinho. Isso alimenta tanto quanto o pão concreto. Assim como Jesus nos alimenta, sejamos também alimento para os idosos”, reforçou o Padre Júlio.

A graça, alegria e a solidariedade das gêmeas Kiara e Yasmim, alunas do INSP Flamengo, fecharam com chave de ouro essa verdadeira aula de solidariedade. Por iniciativa própria, elas produziram e venderam doces e reverteram o lucro em alimentos para serem doados. Ambas leram um texto para Padre Júlio e perguntaram: “O que lhe inspira a ter tanta atitude e iniciativa? Fale um pouco para nós sobre a importância de nos colocarmos no lugar do outro e também doarmos olhares, escutas e falas”.
“A inspiração vem do ensinamento dessas crianças tão pequeninas e simples, tão corajosas e solidárias, isso nos faz também ter coragem de estarmos sempre disponíveis e preparados para fazer o bem. Vocês são um grande exemplo para todos nós que nos faz caminhar e não desistir nunca. Muito obrigado, meninas, que Deus abençoe, proteja e guarde sempre”, encerrou Padre Júlio Lancellotti.

 

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